Empregador poderá exigir a vacinação de seus empregados?
Art. 3º Para enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional de que trata esta Lei, as autoridades poderão adotar, no âmbito de suas competências, entre outras, as seguintes medidas: (Redação dada pela Lei nº 14.035, de 2020)
I - isolamento;
II - quarentena;
III - determinação de realização compulsória de:
(...)
d) vacinação e outras medidas profiláticas; ou
(...)
Neste ponto temos que o Supremo Tribunal Federal enfrentou o tema ao julgar as ADIs 6.586 e 6.587, que tratam dos aspectos envolvendo a vacinação compulsória contra a COVID-19 prevista no art. 3º, III, “d”, da Lei 13.979/2020. A relatoria da decisão ficou por conta do Ministro Ricardo Lewandowski que, em resumo, votou pela constitucionalidade da vacinação compulsória, estabelecendo que:“(I) a vacinação compulsória não significa vacinação forçada, por exigir sempre o consentimento do usuário, podendo, contudo, ser implementada por meio de medidas indiretas, as quais compreendem, dentre outras, a restrição ao exercício de certas atividades ou à frequência de determinados lugares, desde que previstas em lei, ou dela decorrentes, e (i) tenham como base evidências científicas e análises estratégicas pertinentes, (ii) venham acompanhadas de ampla informação sobre a eficácia, segurança e contraindicações dos imunizantes, (iii) respeitem a dignidade humana e os direitos fundamentais das pessoas; (iv) atendam aos critérios de razoabilidade e proporcionalidade, e (v) sejam as vacinas distribuídas universal e gratuitamente; e
(II) tais medidas, com as limitações acima expostas, podem ser implementadas tanto pela União como pelos Estados, Distrito Federal e Municípios, respeitadas as respectivas esferas de competência.”
Ainda no campo das decisões judiciais, tivemos também a tese de repercussão geral fixada no ARE nº 1.267.879 (que discute o direito à recusa à imunização por convicções filosóficas ou religiosas), que assim dispõe: “É constitucional a obrigatoriedade de imunização por meio de vacina que, registrada em órgão de vigilância sanitária, tenha sido incluída no plano nacional de imunizações; ou tenha sua aplicação obrigatória decretada em lei; ou seja objeto de determinação da União, dos estados, do Distrito Federal ou dos municípios com base em consenso médico-científico. Em tais casos, não se caracteriza violação à liberdade de consciência e de convicção filosófica dos pais ou responsáveis, nem tampouco ao poder familiar.” A partir de tais decisões, nos parece evidente que é constitucional a obrigatoriedade da vacina, estando o direito de recusa limitado, especialmente em decorrência do cenário de pandemia vivenciado a duras penas ao redor do mundo. Trata-se de evidente questão de saúde pública, em que o direito/interesse individual não pode se sobrepor ao direito/interesse coletivo. E as razões e os fundamentos que autorizam o empregador a exigir a vacinação de seus empregados vão muito além das decisões judiciais acima. É importante recordar que temos em nossa legislação, a exemplo da própria Constituição Federal (art. 7º, incisos XXII e XXVII), da CLT (art. 157) e das mais diversas Normas Regulamentadoras (NRs), regras que tratam do dever de o empregador garantir um meio ambiente de trabalho saudável e seguro, devendo zelar pela saúde e segurança de seus empregados, buscando evitar acidentes de trabalho e doenças ocupacionais e assim por diante. Essas e tantas outras normas legais tratando sobre a temática são diariamente vistas e revistas dentro das empresas, seja nos seus processos internos, seja em decorrência da atuação dos órgãos fiscalizadores, como do antigo Ministério do Trabalho e Emprego, atual Secretaria Especial de Previdência e Trabalho, vinculada ao atual Ministério da Economia e até mesmo do MPT. Não obstante, tem-se que tais normas e deveres não são “privilégios” apenas das empresas, os trabalhadores também possuem sua cota de responsabilidade como cidadãos, seja por questão ordem pública e social, seja por previsão legal, a exemplo do artigo 158, I da CLT, que prevê o dever de o empregado cumprir todas as diretrizes passadas pelo empregador, em matéria de saúde e segurança do trabalho. Ainda, questões de ordem práticas também surgem no âmbito empresarial, como imposições de terceiros, fornecedores e clientes acerca da vacinação dos empregados que forem lhe prestar serviços e inclusive demandas dos próprios colaboradores de se recusarem a trabalhar com colegas que se negam a tomar a vacina (negacionistas), por constatarem “uma situação de trabalho onde, a seu ver, envolva um risco grave e iminente para a sua vida e saúde” (vide item 1.4.3 da NR-1). Assim, tem-se que tais regramentos e situações também impõe a ambas as partes, empregador e empregado, o dever de observar toda e qualquer norma relativa à segurança e medicina do trabalho. E neste ponto é de extrema relevância dizer que apesar da COVID-19 ser uma doença epidêmica e, a rigor, não causada ou provocada pela atividade laboral, o STF na decisão que suspendeu a eficácia do artigo 29 da MP 927/2020, firmou entendimento da reconhecendo a possibilidade de a COVID-19 ser conhecida como doença ocupacional. A Secretaria Especial de Previdência e Trabalho, por sua vez, emitiu recentemente a Nota Técnica SEI nº 56376/2020/ME, esclarecendo que, para fins previdenciários, a COVID-19 constituirá doença ocupacional após a realização de perícia médica delineando o nexo causal entre o trabalho e a contaminação do empregado, já que a COVID-19 não está elencada no Decreto nº 3.048/99 como doença profissional. Ou seja, a Covid-19 pode sim, ao fim e ao cabo, ser considerada uma doença ocupacional, a depender do reconhecimento por perícia médica da existência ou não de nexo de causalidade com a atividade laboral. Para afastar este risco foi e ainda é de extrema importância a adoção e o reforço de todas as medidas de prevenção e contingenciamento da propagação da COVID-19 no ambiente de trabalho. Mas como dito no início deste artigo, é consenso de que a vacinação de toda a população é a medida mais eficiente para superar a pandemia da COVID-19. Assim, além de todo o trabalho de prevenção e contenção da COVID-19 que vem sendo feito dentro das empresas, o momento exige que novas medidas passem a ser adotadas, como a conscientização dos empregados acerca da importância da imunização, criação de informativos em larga escala sobre eventual exigência de comprovação da vacinação (a partir do momento em que a vacina estiver disponível evidentemente) para ingressar em nos ambientes de trabalho coletivos e ainda, se for o caso, ingressar em estabelecimentos de terceiros (fornecedores, clientes, parceiros comerciais, etc). A partir destas considerações, pode-se concluir que o empregador poderá exigir a comprovação de imunização de seus empregados, devendo ser observado, obviamente, o momento em que a vacina estiver disponível para a faixa de idade, comorbidades e/ou outras classificações em que o empregado se enquadre. As exceções vão existir, evidentemente, tais como o caso dos empregados com restrições médicas quanto à vacina (alergia a componente, gestantes e lactantes, etc), mas que deverão ser tratadas adequadamente caso a caso.Entre em contato pelo telefone (41) 3252-1052 ou envie sua mensagem através do formulário